8.10.04

O que parece é?!

Não creio que o Ministro Gomes da Silva tivesse querido, com os seus públicos e infelizes arrazoados sobre o "contraditório", e a falta dele, relativamente ao programa dominical de Marcelo Rebelo de Sousa, pressionar o dito político-comentador! Apesar de todos estarmos sujeitos à provação de inoportunos e inconvenientes acasos, enfim, apesar de todos termos o direito de proferir declarações infelizes, aquelas de Gomes da Silva foram-no em excesso, por demais públicas e notórias (ou não fossem de um Ministro!) para não serem realmente instintivas, emotivas e irreflectidas! Seguramente, sem nenhuma segunda intenção...tão grande era a aparência da primeira (intenção) nela contida: "pressionar"!

Não creio que o Primeiro Ministro tivesse querido enviar, em público, recados a Marcelo, por interposta pessoa...no caso, Ministro, sobretudo, sendo conhecida a irrequieta, tortuosa e sagaz personalidade e inteligência do destinatário! Se tivesse, porventura, sido essa a sua intenção, seguramente teria encontrado uma qualquer outra forma de tratar do assunto "com pinças"...e não através de núncios sujeitos (como qualquer um!) ao acaso de um momento infeliz, de precipitada desinspiração! Não acredito, portanto, nessas aparências...

Não creio que existam negócios, interesses ou expectativas da Média Capital e/ou dos seus accionistas que pudessem ser perturbados intencionalmente por um Executivo melindrado com uns meros comentários de um político (ainda que brilhante) fora do activo!
Não, não creio! Seria demasiado "terceiro-mundista", pouco subtil e arriscado (no mínimo, já para não falar em questões de transparência, de ética ou do funcionamento do Estado de Direito!). A "impunidade" seria tão grande que, mesmo o mais descuidado político no activo não seria assim tão distraído, a tal ponto que ousasse correr o risco de o fazer!
Além disso, nem sei se valeria mesmo a pena fazê-lo, dada a omnipresença difusa e, consequentemente, discreta, do Estado em tudo o que verdadeiramente interessa e é estratégico, sob o ponto de vista económico. Porquê tentar "matar moscas com um canhão", deixando um suspeito odor a pólvora, quando qualquer estratega mediano conseguiria engendrar uma forma de, indirectamente, atingir os mesmos objectivos, usando os intermináveis e opacos meios e instrumentos de poder (por exemplo, na própria comunicação social) de que institucionalmente o Estado dispõe para o fazer, no recato dos corredores e dos gabinetes, na intimidade de alguns almoços, através de intermediários hábeis e tão eficazes como desconhecidos, etc., etc.?

Sim, porquê actuar assim, deixando um rasto de evidências sobre as possíveis interligações intimas de interesses políticos com interesses económicos privados? Porquê dar azo a especulações mal intencionadas que, por si só, poriam em risco os próprios objectivos políticos e/ou económicos alegadamente em causa? Não creio nessa hipotética aparência...seria demasiado básico!

Não acredito, também, que o Presidente da Média Capital, conhecendo a já referida personalidade e estatuto (leia-se, "poder das audiências") desse seu colaborador (?), prestador de serviços (?), funcionário (?), que por acaso tem sido comentador, fosse tão imprudente ao ponto de o tentar forçar a ser mais comedido nas suas críticas ao Executivo. De igual modo, também não creio nessa ténue aparência que consiste em Marcelo ter aproveitado o ensejo (o putativo ensejo, diga-se...já que também não acredito na sua ocorrência!) para maquiavelicamente desencadear ou empolar um facto político negativo para o actual Executivo, para simplesmente embaraçar o Primeiro Ministro. Sobretudo agora que as perspectivas deste mesmo Primeiro Ministro vir a ser candidato á Presidência da República parecem mais distantes do que quando Marcelo disse que (só) seria candidato se, precisamente, o actual Primeiro Ministro avançasse sem adversário, dentro do mesmo espectro partidário!

Não creio nestas aparências.
O problema é que, para alguns, em política, o que parece...é!