Definitivamente, o Bloco de Esquerda está na moda. O Congresso do Partido Socialista, entre socráticos e alegristas teve-o como referência central, o Partido Comunista, fingindo ignorá-lo, teme-o profundamente, os partidos do governo concedem-lhe atenção desproporcionada, a comunicação social consagra-lhe um espaço que ele não possui e, até a direita mais liberal e descomprometida homenageia-o nas blogosféricas paragens d'O Anacleto.
O fenómeno tem, contudo, explicação. A esquerda partidária - PS e PCP, teme pelo seu eleitorado, o governo aposta na divisão de votos dos adversários e os media fascinam-se com tamanha demonstração de inteligência e cultura. Os comunistas, tendo ainda presente o que lhes sucedeu em Itália, receiam que o mesmo lhes aconteça por aqui. O PS, preso a um discurso responsável e dirigido ao grande centro eleitoral conservador e burguês, teme que o fascínio de um «discurso de ideais» lhes possa trazer prejuízos. Estes receios partem, contudo, de uma deficiente análise do «produto» em questão.
Na verdade, o Bloco de Esquerda é o resultado do trabalho de décadas de alguns políticos profissionais ligados, desde o 25 de Abril, a grupos de extrema-esquerda, que, fartos da marginalidade política, se assumiram como verdadeiramente são: uma esquerda urbana, «chic ou caviar», intelectualizada, sociologicamente ligada a uma classe média-alta, a burguesia académica das grandes cidades que ambiciona ascender ao vértice do sistema político. Já não está em causa tomar lugar na revolução, mas tomar lugares no parlamento. Já se não pretende derrubar o regime, mas governá-lo. De certo modo, também o Bloco é uma grande vitória do «centrão» político e eleitoral do nosso país.
Porém, reconhecendo-se-lhe o feito de ter conseguido furar o bloqueio dos partidos do sistema, o Bloco de Esquerda deu já o que tinha a dar. O eleitorado do Partido Comunista, sobretudo o que vive no seu feudo eleitoral alentejano, sempre nutriu ao longo da sua história um profundo «desprezo de classe» pelos «intelectuais» universitários burgueses. Os socialistas, conscientes da rotatividade secular dos dois grandes partidos do centro do nosso sistema, dificilmente trocarão as certezas de um futuro de poder, pelas emoções fortes de um discurso mais radicalizado (e que, ainda por cima, o remoçado poeta Alegre parece conseguir fazer). Os seguidores do Doutor Louçã atingiram o seu princípio político de Peter. A Revolução devorou sempre os seus melhores e nunca teve contemplações para com os seus ideólogos.
A não ser que, por obsessão e obtusidade, lhes queiram dar mais do que aquilo que verdadeiramente eles conseguirão alcançar.