20.4.05

Após a tempestade, vem a bonança

Os tempos não estão, de facto, fáceis. Ter ideias, nos dias de hoje, significa "ser dogmático". Aquilo que deveriam ser meras regras de convivência social, assumiram a dignidade de "valores": as noções de "tolerância", "pluralismo", "multiculturalismo", embora as considere essenciais para viver em sociedade, estas sim, assumiram uma dimensão dogmática, passando a ser valores em si.

Os ataques a Ratzinger - que podem ser lidos no artigo de Jonathan Last linkado no meu post anterior - são promovidos ao abrigo, precisamente, destes "novos/velhos" valores: Ratzinger "não serve", pois é um "conservador", não advogará o "pluralismo", pois é "contra as mulheres", e a sua origem germanófila irá acentuar o "eurocentrismo" da Igreja, pondo em risco o "diálogo" multicultural e ecuménico. Pluralismo e Tolerância sim, desde que o Papa seja Anacleto. As críticas que são feitas ao novo Papa, na linha deste "politicamente correcto" que manieta o pensamento das massas, são elas próprias a expressão da intolerância desta corrente de pensamento único que embruteceu uma parte do mundo ocidental.

JP II foi, de facto, um Papa exemplar. Entre outras coisas, viajou, promoveu o ecumenismo e o multiculturalismo. Defendeu como poucos líderes mundiais a Paz no Mundo. Todo o seu Papado, e os frutos do seu esforço ao longo de 27 anos, são já património da Igreja e da Humanidade. O grande problema está em que a essência da Igreja não é apenas o Ecumenismo, nem a defesa da Paz, nem o Auxílio dos Pobres. Esta faceta foi amplamente enfatizada pelos media e pelos opinion makers acéfalos do politicamente correcto, pois é aquela que agrada à sapienzia ocidental pós-moderna, socialista: a imagem de um Papa Laicizado, esta síntese da obra de JP II, é muito conveniente para apresentar às massas. O legado de JP II, contudo, não se esgota nem reduz nesta imagem construída, sobretudo, durante a sua agonia e após a sua morte, e que de tanto ser repetida, se arrisca a ficar para a História.

Ao contrário do que muitos afirmam, Ratzinger não representa um "retrocesso" face ao que foi o Papado anterior. É, apenas, a consagração daqueles que, ao longo de 27 anos, tão perto estiveram de JPII, e que irão prosseguir o caminho da Igreja com serenidade. A Igreja e o mundo seguem os seus caminhos.

Não sei como será Bento XVI. Esta dúvida não será distinta da que assolou vários espíritos após a escolha de JPII. Bento XVI não será certamente o Salvador, nem irá solucionar a fome em África, certas pandemias, nem inverter a moral sexual dominante. Também não irá salvar o Estado Social. Estas questões só os homens e mulheres poderão solucionar. A Igreja terá o seu papel, num filme com vários protagonistas.

Agora, mais uma vez, o que me parece já óbvia, e que se conclui a partir de uma análise fria das incidências dos últimos dias, é a necessidade de persistir no combate contra a ditadura do "politicamente correcto", que exige pluralismo e tolerância, mas num quadro de pensamento que é o seu, e que nos atira a todos para o Vazio.
Rodrigo Adão da Fonseca