14.11.04

FICAVA-LHE TÃO BEM



Se alguma conclusão se pode retirar com segurança do Congresso do PSD que hoje termina, ela é a de que o Dr. Paulo Portas é, cada vez mais, a figura principal da direita portuguesa.
A força dos factos impôs o antigo director de «O Independente» como a pedra angular do actual governo e da maioria parlamentar que o sustenta, e fez dele o centro das atenções de um partido, o PSD, que, devendo estimá-lo como garantia de sobrevivência no poder, o elegeu como adversário, ou, pelo menos, como a sua referência principal. Ninguém duvida que, por maiores méritos eleitorais que Santana Lopes possua, o PSD só poderá manter o governo em 2006 numa bem alinhavada estratégia com o CDS/PP, que passe por uma conclusão feliz da actual legislatura e a preparação dessas eleições em função de um interesse comum.
Diga-se, de resto, que o CDS/PP de hoje, já não é o mesmo partido que entrou para o governo de Durão Barroso. Nessa altura, em pouco passava de um grupo de fiéis em torno do líder e de alguns esparsos militantes e dirigentes que, à força dos anos, não sabiam, ou não podiam, estar noutro lugar. A verdade é que o CDS não conhecia o poder desde o fim da AD, onde, aliás, estivera por pouco tempo. Mesmo nas autarquias, só sobejavam duas ou três posições, sendo penoso ver o CDS a mingar e desaparecer em cada um desses acto eleitorais. Na alta administração pública, nas empresas do Estado, nos lugares de influência política, o CDS não tinha qualquer expressão. Ao contrário do PS e do PSD, nunca tivera uma permanência longa no poder que lhe permitisse aí colocar os seus homens. Como é sabido, actualmente o CDS está por todo o lado. Mesmo que esta legislatura terminasse amanhã, o CDS sairia dela como um partido de poder e de futuro.

Mérito indiscutível de Paulo Portas que, em dificílimas circunstâncias conseguiu o que em vinte anos não obtiveram Lucas Pires, Freitas do Amaral, Adriano Moreira e Manuel Monteiro. Em política, como na vida, as coisas são o que são, e, no CDS-PP, não há dúvida que muitos outros tentaram, mas só Portas conseguiu. Com um invejável capital adquirido para si e para o seu partido, falta-lhe, porém, consolidar o que conquistou e alicerçar o futuro, ele que, com pouco mais de quarenta anos, não quererá certamente abandonar a política nos tempos mais próximos.
Isto significa que o Dr. Paulo Portas tem de demonstrar que o CDS cresceu não apenas por estar no poder, mas porque é, de facto, o espaço para o qual converge a direita democrática, no qual se podem reconhecer democratas-cristãos, conservadores e liberais.
Para tanto, Portas tem de resolver o problema que o Dr. Manuel Monteiro e a sua gente lhe criaram ao terem abandonado o CDS para constituir uma nova força política. Não fossem as especificidades das personagens envolvidas, o normal teria sido que o Dr. Monteiro e os seus seguidores se tivessem deixado estar no seu partido de sempre à espera de melhores dias. E que o tempo e o poder que, em política, conciliam Deus e o Diabo, tratassem com naturalidade do resto.
Não foi, contudo, isso que sucedeu. Com todos os seus defeitos e o seu reduzido 1% de eleitorado, a Nova Democracia revelou um mérito indesmentível e que tem de ser reconhecido: conseguiu atrair para a política e para a direita um conjunto de quadros de qualidade indiscutível. Essa gente faz falta ao CDS, quer porque tem qualidade, quer porque faria com que o partido fosse mais plural do que é presentemente, dando-lhe uma outra dimensão. A que tem, por exemplo, o PSD, onde desde sempre couberam as mais variadas tendências, lideradas por inimigos irreconciliáveis: quem diria há alguns anos, que Pedro Santana Lopes chegaria à chefia do governo pela mão de Durão Barroso?
É certo que não seria fácil chegar a um entendimento com o Dr. Monteiro, cada vez mais acrimonioso e que não conseguiu ainda enterrar os fantasmas do passado, continuando teimosamente à espera que os seus méritos políticos sejam eleitoralmente reconhecidos. Como, também, seria previsível que algumas bases do CDS iriam manifestar algum desconforto, ou mesmo crispação, com esse reencontro. São, no entanto, gestos e decisões desta natureza que transformam grupos de pessoas circunstancialmente instalados no poder em instituições de governo. E, numa altura em que se inicia um tão exigente e imprevisível ciclo eleitoral, retirar Manuel Monteiro e os seus do getho político onde se entrincheiraram, federando no CDS-PP toda a direita democrática do regime, só poderia abonar em favor de Paulo Portas e reverter para o futuro do partido que lidera. Ficava-lhe bem.