Do arquiteto Nuno Portas,
A Bolha Imobiliária: Causa Ou Efeito? :
Para além desta dificuldade, a tradução destas previsões em planos de usos do solo ainda é mais problemática: é que, ao contrário do que muitos pensam, não basta multiplicar metros quadrados ou número de fogos por um índice de ocupação, para estimar o solo urbanizável a prever num PDM. É sabido que a área edificada é apenas uma fracção do seu total, que inclui outras actividades, vias, espaços livres ou intersticiais, etc. Não tem, portanto, sentido dizer-se que os PDM do país, todos somados, dariam para dezenas de milhões de portugueses!
O que estes cálculos simplistas não têm em conta é que o que mais cresce (sobretudo com o PIB) é o espaço médio por habitante, porque aumentam as suas necessidades, as novas instalações das actividades e equipamentos, os espaços livres urbanos, as vias de comunicação e os estacionamentos, etc. E, para além disto tudo, nenhum plano pode ser concebido como um fato por medida: é essencial para a sua própria viabilidade que ofereça para o médio prazo várias frentes de desenvolvimento, para além de outras razões relacionadas com a incerteza das preferências, com a redução dos riscos de entesouramento ou oligopólio por parte dos proprietários ou promotores beneficiados pelo "aperto" do zonamento.
Chegamos assim à parte crucial da tese: a da responsabilidade da gestão municipal no suposto excesso de urbanização. Parece-me, no mínimo, surpreendente que alguém conhecedor do terreno - economistas, urbanistas, juristas - possa pensar e afirmar que os municípios são os principais responsáveis pela "bolha imobiliária" para auferirem mais receitas, donde a necessidade de lhas retirar quanto antes.
É que se esse raciocínio estivesse certo, quereria dizer que os promotores imobiliários deste país construíam casas só para aquecer e encher os cofres das câmaras! Ora, se há milhares de fogos novos construídos todos os anos que estão por usar, é porque alguém os compra (em prazo aceitável pelo promotor da oferta) por outras razões que não a de ir para lá viver de imediato. E é este o fenómeno que importa perceber, para que se saiba onde e como pode ser atenuado com eficácia.