22.4.05

Plano ou choque tecnológico?

Uma das medidas integrantes do plano tecnológico e ontem anunciada pelo ministro Gago, consiste na concessão de benefícios fiscais às empresas que invistam em I&D. O governa opta decididamente pela complicação, em lugar de simplificar a legislação fiscal e reduzir os impostos de forma generalizada.

Para além da discriminação que introduzem entre os contribuintes, os benefícios fiscais, todo o seu funcionamento e cadeia de controlo, revestem-se de características algo perversas:
  • A habitual complexidade na sua aplicação, sempre em resultado de elaboradíssimas fórmulas desenvolvidas por mentes brilhantes, da necessidade de novos impressos, de alterações das rotinas contabilísticas, de mais informação a reportar, coisa de somenos para quem é totalmente alheio às realidades do mundo empresarial;
  • A natural tendência para empolar as rubricas subsidiadas que levará, por hipótese, a imputar ao laboratório a maioria dos custos de limpeza da fábrica, que se tornarão pois numa das mais importantes componentes da Investigação e Desenvolvimento;
  • Como o Estado funciona em câmara lenta, concluirá apenas ao fim de vários milhões e na sequência de uma qualquer manchete ou reportagem televisiva, que uns poucos enriqueceram e que o registo de patentes não denota alterações visíveis;
  • Seguir-se-á a reacção própria dos burocratas: jamais acabar com os benefícios, mas "aperfeiçoá-los" e "reforçar o controlo" com mais algumas dezenas de artigos e centenas de alíneas no respectivo diploma, fazendo as delícias e a fortuna dos consultores fiscais, a exigência de acrescidos e cada vez mais complicados reportings por parte das empresas, a criação de uma "brigada de inspecção" na dependência directa do ministro e destinada a fiscalizar as empresas in loco, medida esta anunciada com grande pompa e em tons normalmente ameaçadores.

No limite, uma empresa que tenha projectos de desenvolvimento com potencial e pretenda recorrer aos apoios oficiais, irá delapidar recursos não na investigação propriamente dita, mas na importação de burocracia, seja na implementação de processos para justificar o benefício, na alteração dos sistemas de informação que permitam o reporting exigido pela tutela, na produção e pesquisa de vários gigas de informação de cada vez que é visitada pela "brigada de inspecção".

No final do processo, apurados todos os custos, directos e ocultos, dificilmente eles serão compensados pelo benefício fiscal. Com a agravante de que o Departamento de Investigação deixa de a fazer para satisfazer os burocratas do ministério com os periódicos relatórios de execução, prestados em sofisticados modelos, para cujo preenchimento foi necessário contratar uma empresa de desenvolvimento informático.

Aqui chegados, o plano tecnológico já se terá transformado em choque.