ou porque é que um sistema, cujo bom funcionamento dependa da virtude dos respectivos agentes, funcionará mal e será dominado pelos seus agentes menos virtuosos.
Para que servem as denúncias de Paulo Morais? Não servem, como é óbvio, para denunciar situações específicas. Uma pessoa suficientemente inteligente não personaliza acusações que não pode provar e as acusações de corrupção não se provam assim tão facilmente. A única coisa que se pode fazer é uma denúncia abstracta, e foi isso que Paulo Morais fez.
As denúncias abstractas servem para se perceber quais as falhas no sistema que favorecem a corrupção. E a falha principal do sistema é que os detentores de cargos políticos podem criar, destruir ou transferir direitos de propriedade por decreto [1], apelando para justificações ideológicas e para um suposto interesse público, o que os torna potenciais produtores de serviços políticos para quem os quiser e puder comprar.
A caça ao político corrupto não resolve este problema porque, havendo dinheiro e poder para distribuir, a corrupção infiltra-se através de todo o sistema até atingir as instituições que deviam perseguir os corruptos. Mas muitos continuam a acreditar na caça ao corrupto como solução para os problemas institucionais porque não lhes ocorre que é mais fácil reformar as instituições do que reformar a natureza humana. Sempre existirão pessoas corruptíveis, só que uns sistemas favorecem as pessoas corruptíveis enquanto outros favorecem as pessoas incorruptíveis. Cabe-nos optar por sistemas que favoreçam as pessoas incorruptíveis. Mas, claro, aqueles que optarem por um sistema em que a decisão política prevalece sobre o direito de propriedade não se poderão queixar dos resultados.
O tipo de corrupção denunciado por Paulo Morais resolve-se pela instituição de um sistema em que os políticos não possam criar, destruir ou transferir direitos de propriedade. O direito de propriedade deve obedecer a uma lei geral e abstracta, a que os políticos também devem estar sujeitos, e os potenciais conflitos devem ser resolvidos pelos tribunais e não por políticos.
[1] Um terreno pode ser expropriado para fins públicos, para em seguida ser doado a um clube de futebol para fins desportivos. Mais tarde, o mesmo terreno poderá ser transformado numa urbanização. Ou então, os direitos de construção num determinado local podem ser modificados para que um determinado empreiteiro possa construir 10 andares onde só eram permitidos 5.