24.8.05

Divergência intrigante (II)

O nosso Leitor Anonymous, que pelos vistos me conhece mas não se quer dar a conhecer, ele lá saberá porquê, coloca, em comentário a esta minha posta e com um "sotaque" retintamente "aparelhês", as seguintes questões:
  1. Quem era Paulo Morais?
  2. Que currículo tinha na política?
  3. Lá porque, quase por acaso, chegou a vice presidente da Câmara do Porto, que direitos tem a continuar na vida política?
  4. E se deve o lugar ao seu partido, porque é que passa a vida a criticar, como se pudesse dizer tudo o que lhe apetece?
  5. Se não gosta do partido, porque é que não se demite?

Passemos então às respostas, garantidamente incompletas, pois só o visado as pode dar de forma exaustiva, rigorosa e categórica:

1. Matemático, professor universitário, antigo dirigente da UIPSS (União das Instituições Particulares de Solidariedade Social), uma das maiores autoridades do País em sistemas eleitorais e sondagens, polemista já consagrado e com uma especial habilidade e apetência em pôr o dedo em feridas (melhor dizendo, em chagas contagiosas), provocando com isso frequentes e sonoros urros, não de dor mas de despeito pela denúncia de pragas, que se acha mais conveniente encobrir e deixar alastrar.

2. Julgo que pequeno ou nulo, à semelhança de muitos outros debutantes em cargos de responsabilidade. So, what? Que currículo tinha na política Cavaco Silva quando Sá Carneiro o escolheu para ministro das finanças? Claro que eu percebo a questão. "Currículo na política", na acepção puramente partidocrática em que a mesma é formulada, significa toda uma tarimba feita a partir das "jotas" ou dos núcleos partidários, com uma "subida a pulso" ao longo da pirâmide da organização política, para a qual o único mérito é o de saber ganhar as eleições internas com as frequentes golpadas de inscrições atempadas de militantes e a sempre cuidada arregimentação dos diferentes e organizados sindicatos de voto. Estes, terão sempre a garantia de um mínimo de lugares nos directórios, em respeito escrupuloso pela ditadura das quotas. É portanto a conquista de cargos no partido ou em organizações afins que constitui o único "passaporte válido", que propicia as competências e capacidades necessárias para amanhã desempenhar cargos na administração pública, electivos ou de nomeação. Ao que julgo saber, Paulo Morais não dispõe de tal currículo, o que só abona a seu favor.

3. Tem exactamente os mesmos direitos que qualquer cidadão eleitor, nem mais nem menos, sendo isso independente do facto de ter antes desempenhado qualquer cargo. Mas o que é delicioso na questão é o "quase por acaso". Remete para a tal falta de currículo político e para uma imperdoável distracção do aparelho que, na altura,"permitiu" que Rui Rio indicasse os lugares cimeiros da lista de vereadores, talvez porque considerasse impossível a vitória. O ter chegado a vice presidente da Câmara resultou também de uma escolha do Presidente que, para tal, não terá ouvido o aparelho - nem tinha de o fazer.

4. Eis a lógica aparelhística no seu máximo esplendor! Qualquer lugar político só pode ser ocupado por via do partido - melhor dizendo, da respectiva nomenklatura - e o seu titular fica, a partir de então, obrigado a uma fidelidade e submissão caninas àquele e ao respeito absoluto pela lei da rolha. Ninguém ouse criticar, ninguém pode de forma alguma "dizer tudo o que lhe apetece", tenha ou não razão para tal. O partido como divindade suprema, infalível, intocável. Staline está vivo e recomenda-se!

5. Quem não está bem muda-se, é verdade, e seria um sossego ver pelas costas personagens inconvenientes que não se coíbem em denunciar a podridão. Alternativamente, poderá equacionar-se a auto-reforma dos partidos, condição sine qua non para a implementação de reformas de fundo no País. Não sei se Paulo Morais se estará a interrogar sobre estas alternativas mas, se escolher a última, só tenho de lhe gabar a coragem, fé e capacidade de resistência.


Finalmente, meu caro Anonymous, se não percebeu o sentido da minha posta, elucido-o que ela transcendia em muito a mera questiúncula pessoal - o tema em que mais se deliciam os aparelhos - e apenas questionava a contradição entre o apoio e solidariedade que o PSD nunca regateou a Paulo Morais ao longo do mandato e a repentina rejeição de que agora dá mostras, supostamente pelo excesso de "polémicas" em que ele esteve envolvido. Relativamente a estas, o blasfemo PMF já as desmistificou de forma pertinente.