14.10.05

A JUSTIÇA VENEZUELANA ou o repristinar do "fardo do homem branco"

Quando vejo as preocupações daquele senhor que ainda continua a ser o Procurador Geral da República deste país, as diligências várias da nossa diplomacia, o esbracejar de alguns ministros, o "interesse humanitário" que o Senhor D. João VI reencarnado acedeu demonstrar pelo caso e as manifestações de timbre internacional em Salamanca, tudo e todos protestando contra a morosidade da Justiça venezuelana, o tempo de prisão preventiva do piloto português, os sucessivos adiamentos das audiências de julgamento, as consequentes acusações mais ou menos veladas de terceiro-mundismo quanto ao funcionamento daquele sistema judicial, o tom arrogante de alguma imprensa nacional quando analisa a actuação dos magistrados venezuelanos, as doutas críticas ao labirinto interpretativo das regras processuails daquele país, só me dá vontade de dizer:
- PONHAM OS OLHINHOS NO NOSSO PRÓPRIO SISTEMA JUDICIAL!
Vejam como funcionam os nossos Tribunais!
Examinem a actuação dos nossos magistrados!
Façam bem as contas à duração real da prisão preventiva neste país!
Vejam como estão as nossas prisões!
Analisem o tempo médio dos nossos processos judiciais!
Percam algum tempo no exercício, quase cabalístico, da tarefa hermenêutica de decifrar o sentido das nossas leis!
Reflictam acerca da impunidade de todos os agentes que, quotidianamente, fazem com que as coisas fiquem cada vez mais como estão!
Tirem ilações sobre o papel das corporações que pululam na Justiça portuguesa e cuja preocupação solitária é defender a sua específica coutada a qualquer custo!
Depois, façam o favor de compararem os resultados com os de qualquer país sul-americano, Venezuela, Brasil, Argentina, Chile, Peru ou outros.
Veremos se, na verdade, após isso tudo, ainda teremos força moral para atirar desdenhosas acusações para o "telhado do vizinho", nesta matéria, como aquelas que se têm ouvido nos últimos tempos.

P.S. Os meus sinceros parabéns ao Embaixador da Venezuela pela sua carta, hoje, no DN. (aditamento: os "parabéns" circunscrevem-se, exclusivamente, à comparação entre o funcionamento dos 2 sistemas judiciais e não a qualquer eventual extrapolação política)