3.10.05

Túnel de Ceuta - Tempo para uma mudança de sentido?

1. Cidade milenar, o Porto apresenta, no seu centro histórico e nas regiões anexas, vulgarmente designadas por "baixa" da cidade, uma estrutura composta sobretudo por ruas relativamente estreitas.

Enquanto que, até à década de 1960, o relativamente escasso número de automóveis permitia o fluxo de trânsito a um ritmo razoável, o posterior aumento do número de automóveis em circulação veio colocar problemas inultrapassáveis a um conjunto de ruas concebidas noutros tempos e em outras circunstâncias.

A cidade do Porto transitou então para uma situação na qual o seu centro se encontrava fortemente sobrecarregado por automóveis, enquanto que a sua periferia registava uma circulação automóvel mais facilitada, sendo de registar duas vias que circundam por completo o centro histórico, a Estrada da Circunvalação, próxima do limite da cidade, e a Via de Cintura Interna, no interior desta.

Foco tradicional de comércio, aliás com tradição de seriedade e de diversidade, o centro do Porto sentiu fortemente a concorrência gerada pelo desenvolvimento de importantes espaços comerciais próximos dos limites da cidade, processo com início há cerca de 20 anos atrás. Tal fenómeno associou-se, de resto, a um aumento da entrada de produtos provenientes de países estrangeiros, correspondente, no fundo, ao fenómeno da globalização. Muitos dos produtos tradicionalmente vendidos no centro do Porto eram, na realidade, de origem nacional. Mudaram os locais e as formas da distribuição comercial, mas também a natureza dos produtos vendidos.

2. A estrutura viária da cidade constituiu, a partir de certa altura, uma muralha impedindo a entrada de automóveis na cidade, sendo gritante a diferença relativamente aos centros comerciais situados na periferia da cidade, o acesso aos quais era relativamente simples, para não falar no estacionamento, num tempo em que muito mais pessoas dispunham de automóvel.

Ao contrário do que se passou em Lisboa, os necessários investimentos em estruturas de transporte colectivo capazes de ultrapassar o bloqueio rodoviário - o metropolitano - e em estruturas físicas capazes de "furar" o referido bloqueio - túneis ou passagens superiores - tardaram em ser concebidos e construídos.

3. Pelas razões atrás aduzidas, foi com grande interesse que se assistiu à construção do túnel que liga a Rua de Ceuta à zona do Hospital de Santo António, túnel esse adiante designado por "Túnel de Ceuta".

Antes de ir mais longe, será porventura oportuno manifestar elevado apreço por todos os envolvidos na referida construção, a qual, salvo melhor opinião, é uma obra que valoriza significativamente a cidade.

Contudo, a conclusão da obra foi ensombrada por uma divergência de opiniões relativamente à circunstância de uma das suas saídas se encontrar próximo de um importante museu. A obra encontra-se, no presente momento, inacabada. Tomaremos a liberdade de defender uma das possíveis soluções para o problema.

4. Tal como havia acontecido com outras obras do mesmo tipo, por exemplo, na R. do Campo Alegre ou mais recentemente, na Av. Fernão de Magalhães, também no Túnel de Ceuta a sua construção visou resolver o problema/paradigma dos anos 1960/1970 - o excesso de carros no interior da cidade.

Contudo, dado o elevado número de anos que decorreu entre a programação da obra e a sua conclusão, o problema/paradigma de trânsito na cidade do Porto, mudou significativamente. Actualmente, a vasta maioria dos automóveis encontra-se na zona periférica da cidade, onde se encontra, de igual forma, a principal actividade comercial.

Tornou-se, portanto, discutível se retirar automóveis do centro da cidade deve constituir a principal prioridade ou se, pelo contrário, a prioridade consistirá em facilitar, quer a entrada, quer a saída de automóveis, do centro da cidade.

As considerações anteriores trazem-nos até à solução que pretendemos defender para o Túnel de Ceuta - a inversão do sentido do trânsito automóvel, com a alteração da posição da saída (entretanto eventualmente transformada em entrada) para o lado oposto da Rua na qual se encontra actualmente (Rua Manuel II) - ficando, em consequência, salvaguardado o Museu Soares dos Reis. A saída do Túnel junto ao Hospital de Santo António poderia ser, ela própria, transformada em entrada, a ela acedendo trânsito com proveniência na R. de Cedofeita.

Idealmente, seria construído um segundo túnel para facilitar o trânsito em sentido inverso. Possivelmente, partiria da R. dos Clérigos e terminaria nas proximidades do Hospital de Santo António, do lado oposto ao acima mencionado. O trânsito poderia prosseguir pela R. da Restauração, sendo necessária uma intervenção suplementar para permitir a chegada dos automóveis até à via panorâmica. De forma temporária, poderia explorar-se a possibilidade de ficar o Túnel de Ceuta dotado de dois sentidos, caso tal fosse tecnicamente possível, designadamente no que respeita aos aspectos relativos à segurança.

Para terminar, diríamos que, se é da lenda que teriam ficado as "tripas" quando se partiu para o cerco a Ceuta, seria o túnel com o mesmo nome que quebraria o novo cerco ao centro da cidade do Porto.

José Pedro Lopes Nunes