2.2.06

Não nos sequestrem.

«Terão toda a razão, os que aqui se indignam em nome do que entendem por "liberdade de expressão".Acho mesmo que deveriam levar os seus ideais às últimas consequências, passando algum tempo numa rua do Cairo, de Rabat ou de Bagdad a distribuir panfletos apelando à igualdade entre homens e mulheres, ilustrados devidamente com caricaturas do Profeta rodeado de ex-virgens.»

Comentário de RS neste post.

Parece-me que RS e alguns outros comentadores estão a passar muito ao lado do fulcro da questão.

Podem contar comigo para defender o direito de um muçulmano a passar uma tarde na Rua do Carmo evangelizando as massas, distribuindo libelos de menorização das esposas perante os maridos, publicitando a sacra disparidade de sexos e solicitando a obrigação legal da utilização do véu nas escolas, tudo devidamente abrilhantado por grandes placares com burlescas caricaturas de todos os símbolos a que devoto respeito. A mim, cabe-me lutar para que este e outros senhores com ideias do género, não tenham sucesso nas suas exigências e que a lei nunca contemple tais desmandos.

Só a cada um de nós, individualmente, cabe a avaliação do que se gosta e do que não se gosta. Se não gostarmos, temos o direito de protestar, montar banca em frente ao outro e vender ideia oposta. Se a indignação for suficientemente forte ou nos sentirmos demasiado insultados, para lá dos limites da lei, até podemos processar o ímpio blasfemador.

É também porque somos livres e porque sabemos o valor da liberdade que evitamos incomodar os outros. Não devemos fumar em locais fechados, não devemos insultar terceiros nem amesquinhar convicções que não partilhamos e nem sequer devemos insultar as crenças dos que insultam diariamente as nossas. A nossa contenção nasce da capacidade que cada um de nós tem de avaliar os actos que pratica e de estabelecer livremente escalas de valores.

Do que não nos podemos esquecer é que nunca seremos livres se a nossa contenção for feita em nome do medo ou da ameaça. Se o que está em causa é o temor da represália, a nossa liberdade já foi sequestrada. Nessas alturas, a aplauso é para quem não se deixa sequestrar.