3.10.05
CARTAS AMERICANAS - IV
Meu Caro CAA,
Não te direi que estou em estado de choque, que os anos vão já pesando e o espanto, para ser genuíno, tem de conhecer coisas prodigiosas, e não bem o caso do que te vou hoje contar.
Trata-se daquele programa da SIC de que já te falei aqui por diversas vezes, o «Esquadrão G». Tinha-te prometido notícias assim que observasse a coisa (salvo seja!) o que aconteceu ontem. Vamos então, como se diz pelas nossas bandas, à «factualidade».
Como já é do teu conhecimento (estas notícias atravessam oceanos), a essência do programa gira em torno das opções sexuais de cinco bamboleantes rapazolas, todos eles «gays», que, para o caso de te teres já esquecido do significado desse vocábulo yankee na lusa língua, quer dizer mesmo homossexuais, bichas, ou coisa mais forte e que lhes era bem ajustada, dado o nível em que os moços se decidiram situar. Todos os cinco muito joviais, muito «in» e «jet-set», civilizadíssimos e educadíssimos, bem vestidos, melhor escanhoados e, presume-se, de banho tomado e a cheirar razoavelmente.
Mas o conceito vai mais longe. Obviamente que se fosse só para ver cinco rapazes efeminados aos guinchinhos histéricos, com vozes aflautadas e trejeitos de donzelas, nem a SIC se tinha de incomodar e gastar dinheiro, nem o telespectador precisava de ficar agarrado à televisão.
A ideia é, porém, outra e mais refinada, e consiste no seguinte: cinco civilizadíssimos «gays» pegam todas as semanas num saloio heterossexual, num burgesso atrogloditado e passeiam-se com ele por tudo quanto é sítio para o transformarem num «homem a sério», mais polido, mais educado e, sobretudo, que agrade mais em casa à mulher, aos filhos, aos pais, se os tiver, e aos amigos. Dão-lhe conselhos e recomendações, compram-lhe roupas, mobílias para a casa, levam-no ao cabeleireiro e a passear. No entretanto, entrevistam-lhe a famelga e os amigos para que estes digam o que lhes vai na alma sobre o espécimen. Como imaginas, da mulher ao porteiro do prédio (olha quem?) os piropos são do melhor. Alguns amigos também se pronunciam e, deixa-me que te diga, não o fizeram para abonar o cavalheiro. Mas não te preocupes, o «Esquadrão G» sabe como dar a volta ao assunto. É para isso que eles lá estão, foi para isso que os inventaram.
O rapaz desta semana ostentava uns pesados quarenta e tal anos, careca, com uma farta bigodaça e um peso existencial em cima dos ombros que não conseguia esconder. Entrevistados os familiares e amigos, a coisa percebia-se: a mulher e a mãe achavam-no um «careta», um «sem jeito» e sem gosto, incompetente na cozinha e no mundo em geral, enfim, quase um energúmeno. Dos filhos, o melhor que ouvi foi ao mais novo que disse que gostava que o pai fosse «menos cota». Ao pai, que o filho fosse diferente, para melhor, pois com certeza. O amigo entrevistado, presume-se que o melhor amigo que o homem tem, pediu, digo, implorou ao «Esquadrãozinho» que lhe devolvessem o jovial camarada de outros tempos, para poderem voltar a frequentar os «bares de antigamente»(?).
No fim do programa, rapado o bigode, decorada a casa, dadas umas lições de culinária e entregue uma bola do Benfica assinada por uma caterva de jogadores (sim, caro CAA, o homem é benfiquista), os cinco cavaleiros do gaylipse sentam-se numa enorme poltrona e ficam a admirar e a comentar em directo numa televisão (prodígio notável) o estado evolutivo do espécimen que ternurentamente criaram.
Escuso de te descrever o fim glorioso de tudo isto. Imaginarás que a coisa não poderia ter acabado melhor. Mas, sempre te digo que foi num lindo repasto com a digníssima esposa, num restaurante lisboeta da moda em que o renovado patego proclamava o seu amor por uma formosa senhora banhada em sorrisos, orgulhos e alegrias. Depois de ter aberto a porta da «nova» casa à velha família e de saltitar à frente deles pelos corredores enquanto ufano dizia: «bócezes vejam isto», «bócezes vejam aquilo», «bócezes vejam que para abrir as portas dos armários, basta empurrá-las»! Os «bócezes» viram, dedilharam, apalparam os quatro cantos à casa e ficaram felizes. Tudo graças ao «Esquadrão G», meu caro! Tudo devido ao «Esquadrão G», meu velho!
Não te espantes quando aterrares por cá, se chegares a casa e os tiveres de visita, ao «Esquadrão G», claro está, que o tipo dos «bócezes» não to mando. Ao fim de dois longos meses a aturares esses cowboys selvagens, incultos e malcriados, bem vais precisar de um banho de civilização, de educação e maneiras. Por mim, se a Fernanda o não fizer, telefono eu para a SIC. Vais ver que ainda me hás-de agradecer.
Um abraço,