A crise no Ensino B+S(+Sup?): os factos; as causas; as soluções; as resistências à mudança.
Os factos
- Todos os meios de comunicação social apresentam a realidade que perdura em Portugal: Portugal é o País da Europa que, em média, mais gasta no Ensino Básico e Secundário por aluno. Porém, o nível de conhecimentos dos alunos à saída dele é o mais baixo. O abandono escolar e o insucesso são os mais elevados dessa mesma Europa. Apontam-se os factos, mas não se indicam as causas profundas e, às vezes sugerem-se soluções, mas não há coragem para as implementar.
- A propósito de Bolonha teoriza-se sobre a melhor fórmula para a duração dos dois primeiros ciclos para todos (!) os Cursos do Ensino Superior (3+2; 4+1; 4+2). Também se teoriza sobre Métodos de Ensino (Paradigmas) implícitos nas declarações de Bolonha. Não se lêem as realidades em Portugal, na Europa e no resto do Mundo.
- Portugal está "atrelado" ao carro da Europa. Tem de acertar o passo e saber bem como fazê-lo.
- Em Portugal a maioria dos alunos que concluem o Ensino Básico e Secundário não tem hábitos de trabalho, nem hábitos de raciocínio. E isso também se estende aos do Ensino Superior.
- Na Europa e no resto do Mundo de hoje a competitividade é uma realidade, quer se queira quer não. A maioria dos jovens portugueses continuam a sair do Ensino Básico e Secundário e até de grande parte do Superior, sem condições para competir com os da média europeia.
- Na grande maioria dos países europeus há dois níveis no Ensino Superior, (veja-se o que a este respeito se diz num "survey" de 45 páginas de 2 ou 3 autores em www.bologna-bergen2005.no/), em particular nas engenharias. Em Portugal luta-se por todos os meios para se ter um só nível.
- Na grande maioria dos países europeus há Ensino Superior Técnico com especificidade própria, que desempenha uma função social muito importante. Em Portugal pensou-se implementá-lo criando os Institutos Politécnicos. Porém, todos os Politécnicos quiseram e querem ser universidades.
- Em Portugal criaram-se e mantêm-se implantados grupos de interesses económicos e/ou ideológicos radicais que usam a sua força para manterem o "status quo" bloqueando qualquer progresso. Na Europa de hoje já não é assim.
- Na Europa, porventura no seguimento de Bolonha, vão criar-se 3 agências internacionais de avaliação dos cursos superiores de cada área. Uma agência fará exigências de nível mínimo para acreditação dos cursos; outra fará exigências de nível médio e a terceira exigências de nível máximo. O nível de ensino e de exigência nas principais universidades portuguesas (e mesmo nalguns politécnicos) deve ser o suficiente para que a grande maioria dos seus cursos seja acreditada pelas agências de nível máximo e de nível médio.
- Têm aparecido, cada vez com mais frequência, nos meios de comunicação social referências a uma "crise" no Ensino Superior Público. É uma falsa questão. O Ensino Superior Público, em geral, e nomeadamente o Ensino Universitário de Engenharia, é aquele que ainda mantém nível porque, e muito bem, foram instituídas Comissões de Avaliação para cada curso pela Fundação das Universidades e por um organismo semelhante para os Politécnicos, as quais acreditam uns cursos e outros não. Além disso, cada curso é também avaliado por outras Comissões nomeadas por cada Ordem (dos Engenheiros, dos Advogados, dos Arquitectos, etc.), que o "acreditam", ou não, como habilitação para uma carreira profissional.
- Ao contrário do que acontece com os "diplomados" que saem do Ensino Secundário em Portugal, as estatísticas internacionais não dizem que os "Diplomados" portugueses com um Curso Superior, em geral, estejam abaixo da média europeia. Ainda não estão. Pelo contrário, pelo menos no que toca ao Ensino Público Universitário das Engenharias, há uma muito boa aceitação internacional, quer pelas melhores universidades europeias e dos EUA, que sempre têm aceite os nossos "licenciados" que pretendem obter graus mais elevados no estrangeiro, quer por empresas de renome internacional que os aceitam e preferem no competitivo "mercado" onde operam. Assim, os nossos actuais licenciados satisfazem os objectivos de "empregabilidade" e "mobilidade" estabelecidos nas declarações de Bolonha. Se o Governos Português impuser a duração de 3 anos para o 1º ciclo de estudos em todos os cursos do Ensino Superior (excepto Medicina), que é o mínimo das declarações de Bolonha, é mais que certo que os "Diplomados" com esse 1º ciclo não tenham a "empregabilidade" internacional, que hoje têm.
- Essas campanhas de (des)informação a este respeito (e não só) são, em geral, promovidas de forma directa ou indirecta pelas Universidades não Públicas, procurando que, por redução de financiamento estatal, tenham as Universidades Públicas de aumentar as propinas e, desta forma, lhes não façam concorrência económica. Porém, o facto é que os alunos preferem, em geral, o Ensino Superior Público, menos por razões do custo das propinas, mas, essencialmente porque esse Ensino ainda tem, na maioria dos cursos, um bom nível, pelos padrões europeus de Escolas Superiores semelhantes. A confirmar esta afirmação está o facto da grande maioria das Universidades não Públicas ir buscar os seus professores doutorados às Universidades Públicas. São os chamados "turbo professores", porque correm da sua Universidade Pública para dar aulas, em regimen de acumulação, numa, duas e às vezes três universidades não públicas.
- Isto não quer dizer que tudo vai bem nas Universidades Públicas. Logo à partida é preciso acabar de vez com os "turbo professores". Logo a seguir é preciso acabar com a importância que os estudantes têm no Senado na eleição do Reitor: Os votos dos estudantes com mais um só voto de um funcionário podem eleger o Reitor da sua universidade, contra os votos de todos os docentes. Esta questão, bem como a anterior, são uma singularidade de Portugal em relação a todos os países da Europa (e do Mundo). Se com Bolonha nos propomos "acertar o passo" com a Europa, temos de começar por corrigir este tipo de anomalias. Também se pode, e deve, melhorar o Ensino-Aprendizagem, centrando-o, no Aluno como "actor", mas obrigando-o a trabalhar desde o primeiro dia de aulas , e não andar permanentemente em "arruaças", a invadir o Senado, fechar portas a cadeado, etc., etc. Isto também só acontece em Portugal. De modo algum se vê nos outros países europeus. Finalmente, um aluno repetidamente repetente, não pode ficar indefinidamente num curso que, porventura, escolheu mal, e/ou não tem capacidade para concluir. Tem de haver "prescrições" como acontece nas outras universidades europeias.
- Também têm aparecido nos meios de comunicação social "arautos" da necessidade de retirar às Universidades Públicas a autonomia de que gozam. Ela já não é total, nem mesmo a autonomia Pedagógica. Assim: -a) Elas não intervêm na selecção dos alunos que nelas entram. -b) São obrigadas a aceitar, sem quaisquer provas de entrada, alunos provenientes dos Politécnicos com DESEs e CESEs "equivalentes" a licenciaturas e licenciados das Universidades não Públicas. Esses "licenciados" tentam, assim, "branquear" as suas licenciaturas que não conseguiram ser acreditadas pelas Comissões de avaliação da Ordem dos Engenheiros e da Fundação das Universidades. E esta "guerra" vai aumentar de tom com a adesão de Portugal às declarações de Bolonha, sobretudo se prevalecer para o 1º ciclo de estudos a duração de 3 anos. Com efeito, é por demais evidente que os "Diplomados" com esse 1º ciclo não vão ter ?empregabilidade? internacional, nem mesmo ?empregabilidade? nacional. Então, a necessidade dos "Diplomados" pelos Politécnicos e pelas Universidades não Públicas "branquearem" nas Universidades Públicas os seus Diplomas do 1º ciclo, torna-se muito mais premente.
Nada disto acontece nas boas universidades da Europa, que pretendemos(?) e devemos imitar, já que a ela (Europa) estamos "atrelados".
JBM - Fev 2005