23.9.05

A MORTE DAS "ÉLITES" (Breve Manifesto Liberal).

O advento da Democracia Liberal e a progressiva expansão da Economia de Mercado à escala global têm apresentado, como consequência, a divisão do poder entre os cidadãos de cada país e do conjunto dos países. A globalização económica é, também, em alguma medida, uma globalização do poder.

Num regime democrático, dotado de eleições livres, o conjunto de detentores de lugares políticos eleitos, ou de lugares na dependência destes, pode ser integralmente substituído aquando de actos eleitorais.

Numa economia de mercado, a mudança das preferências dos consumidores pode levar a alterações dramáticas na importância de companhias produtoras dos mais variados tipos de produtos.

A democratização da cultura, com o acesso a produtos culturais por parte de grande parte da população, veio colocar um termo ao tempo em que poucos sabiam sequer ler e escrever, tempos nos quais, em consequência, a cultura era reservada aos cultos.

No nosso tempo, idealmente, deverá ter deixado de fazer sentido falar em "élites", esse corpo mal definido de cidadãos do qual alguns aguardam que, à maneira de um Ciro, o país (cada país) seja conduzido à conquista de uma nova Babilónia. Esse corpo, de contornos ignotos, capaz de concitar as esperanças mais vãs, está defunto. A sua procura produzirá, com toda a probabilidade, os mesmos resultados que a procura do Graal.

Ultrapassados estão os tempos em que V. Pareto defendeu que "the history of man is the history of the continuous replacement of certain elites". Como notou J.A. Schumpeter, o capitalismo caracteriza-se pela sua acção sobre as estruturas económicas, "incessantly destroying the old one, incessantly creating a new one". Nessas condições, a posição relativa de cada um na sociedade está continuamente em mutação. No actual contexto, tal processo deveria transportar para o passado "classes", "castas" e "élites".

Na transição do segundo para o terceiro milénio, a História registará a morte das "élites". Mortas de morte natural, sem ocorrência de qualquer forma de violência. Mortas pelo Mercado e pela Democracia, ou seja, pelo consumidor e pelo votante, o mesmo é dizer, por todos nós, com alguma ajuda da televisão e da Internet.

Descansem em paz, diríamos. Porém, há quem não se conforme com a democratização do poder: rejeitando a Democracia directa, ou seja, o referendo; impondo um sistema partidário sem renovação, no qual a alternância pode efectuar-se entre os detentores do poder e quem os precedeu; limitando, de uma forma geral, a concorrência; escolhendo, em nome dos cidadãos, os prestadores de serviços semelhantes de que estes últimos beneficiam; limitando a igualdade de oportunidades, em função de nepotismo ou filiação comum, de índole variada.

Contudo, e infelizmente para as "élites", os dados estão, de facto, lançados. As "massas", entretanto transfiguradas em consumidores e votantes, agarraram já, de facto, grande parte do poder. A Liberdade significa o fim das "élites", razão pela qual os defensores destas últimas lhe são, com frequência, contrários. Liberdade, entre outros aspectos, de estimular a criação e a invenção, ou, de uma forma mais geral, de estimular a inteligência humana.

Existem ainda "élites", no sentido de V. Pareto? Sem dúvida que sim, nos países e territórios não democráticos, bem como em democracias que funcionam defeituosamente. Tal como atrás exposto, a presença de "élites" funciona como uma marca de algo - de falta de Liberdade.

José Pedro Lopes Nunes

Vilamoura, Julho de 2005.