1. Neste caso da Bombardier misturam-se todos os mitos socialistas, nacionalistas e anti-capitalistas.
2. Por exemplo, o Bruno Reis, que diga-se de passagem, se integrou muito bem na linha editorial do Barnabé, diz que o problema não é a natureza pública das empresas, mas a qualidade dos gestores. Como se a qualidade dos gestores não fosse uma consequência da natureza pública das empresas.
3. As empresas públicas prestam acima de tudo serviços políticos. Por isso é que são públicas. Se prestassem serviços para o mercado tanto fazia serem públicas ou privadas. São públicas para servirem os interesses dos partidos políticos que lá podem meter o seu pessoal político e que as podem utilizar para servir os interesses das suas clientelas.
4. Outro fenómeno muito curioso é o mito da Sorefame como empresa competitiva. Fama conquistada há mais de 30 anos nos tempos do condicionamente industrial, o que coloca os comboios da Sorefame ao mesmo nível dos carros Trabant e dos aviões Tupolev: relíquias de um tempo que já não volta.
5. A Sorefame foi vítima, como toda a economia portuguesa, de dezenas de anos de proteccionismo, antes e depois do 25 de Abril, e chegou aos anos 90 sem qualquer capacidade para competir nos mercados internacionais. Não tenham ilusões, a Sorefame como empresa pública não tinha futuro.
6. Para além disso, o mercado feroviário é ele próprio um mercado político e Portugal, em termos políticos, na Europa e no Mundo, vale zero quando comparado com os países sede das principais empresas ferroviárias.
7. Portugal já não pode, por exemplo, condicionar o seu próprio mercado ferroviário (e ainda bem que não pode) porque os concursos estão sujeitos a regras europeia. O que faz sentido do ponto de vista a França e da Alemanha. Se eles é que pagam o TGV e outro projectos ferroviários, vão querer que o TGV seja feito pela Siemens e pela Alstom. Eles não andam a distribuir fundos comunitários para financiar a Sorefame. Maravilhas da integração europeia.
8. Ao contrário do que pensam os socialistas, o emprego não se garante pela manutenção de empresas inviáveis, nem pela manutenção de empresas públicas à custa de subsídios ou da manipulação dos concursos públicos. Esse tipo de políticas pode servir para manter umas centenas de empregos, mas são elas próprias geradoras de desemprego noutros sectores por causa dos problemas estruturais que criam.
9. Aliás, o método socialista de defesa do emprego é muito curioso. Subsidiam-se as empresas ineficientes sobrecarregando-se de impostos as eficientes. Resultado: garantem-se os empregos menos qualificados e impede-se a criação dos mais qualificados. Não resulta. Não pode resultar.
10. Há quem defenda que Portugal deve ser duro com as multinacionais que cá se instalam impondo regras que impeçam a sua posterior deslocalização.
11. O problema desta táctica é que as multinacionais não estão muito interessadas nesse tipo de condições. E elas têm muito por onde escolher.
12. É claro que podemos seguir uma política de orgulhosamente sós. Já temos uma grande tradição nesse tipo de políticas. Podemos inclusive instituir uma política de substituição de importações, comprando mais caro a nós próprios. Podemos fechar as fronteiras, sair da NATO e voltar para os campos cavar batatas. Compre produtos portugueses! Beber vinho é dar de comer a 1 milhão de portugueses.
13. O problema é que o mundo lá fora não pára. Se os portugueses forem muito esquisitos com as multinacionais que cá se pretendem instalar, os chineses, os polacos, os eslovacos e os romenos não serão tão esquisitos.
14. O Letras com Garfos diz que os "Investidores estrangeiros que se portem como a Bombardier se tem portado, podem ser úteis no Sri Lanka (duvido!), mas não interessam a Portugal.".
15. Acho que o Letras com Garfos não percebeu que, na era da globalização, se Portugal não conseguir atrair empresas como a Bombardier, ainda vamos todos ter que emigrar para o Sri Lanka.
16. Muitas pessoas ainda não perceberam que os mercados são voláteis e que a presença de uma determinada empresa num determinado país não é eterna. E ainda bem que não é. É sinal de que as condições do país evoluem. Não se pode desejar que as empresas que se instalaram cá há 15 anos por causa dos salários baixos continuem cá porque entretanto os salários subiram e essas empresas deixaram de ser competitivas.
17. A lição que se deve tirar de tudo isto é que não se pode fugir à lógica do mercado.
18. Portugal tentou ignorar durante mais de 80 anos os mecanismos de mercado. Tentou viver fora do mundo. E o resultado foi a descapitalização relativa da economia Portuguesa. Enquanto os outros se desenvolveram, Portugal foi, em termos relativos, empobrecendo.
19. Os baixos salários em Portugal são uma consequência desse empobrecimento. E o desemprego é uma consequência dos problemas estruturais causados pela falta de liberdade económica.
20. Para resolver os seus problemas económicos, Portugal precisa de investimento externo. Essa é a única forma que o país tem de conseguir o capital que não acumulou quando devia. Sem capital não há empresas competitivas e sem empresas competitivas não há empregos qualificados.
21. Não interessa se há empresas estrangeira que se vão embora ao fim de alguns anos. O que interessa é que as empresas que se vão embora sejam compensadas pelas empresas que entram.
22. Nenhuma economia competitiva pode viver eternamente com as mesmas empresas. Numa economia saudável, as empresas fecham todos os dias e são substituidas por empresas novas, mais competitivas.
23. Agora, o que os socialistas defendem é que para que uma empresa específica não feche se criem as condições que desincentivam a instalação de novas empresas.
24. Ou seja, a solução socialista é igual à solução seguida nos últimos 80 anos e que nos foi empobrecendo.
25. O que é necessário não é uma política de protecção dos empregos existentes.
26. O que é necessário é uma política económica de respeito pelos contratos e pela propriedade privada que consiga atrair em permanência empresas que substituam as que se vão deslocalizando.
27. Portugal tem que ser um país competitivo entre aqueles que querem atrair capital estrangeiro e para isso as bravatas nacionalistas do tipo «cá na terra mandamos nós» ou do tipo «ou aceitam as nossas condições, ou nada feito» podem sair muito caro e só contribuem para afastar investidores e para o atraso da economia nacional.