2.6.06

Qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência

Vamos supor que numa determinada escola um determinado professor falta sistematicamente e quando não falta chega ao ponto de insultar e humilhar os alunos. Quando falta sabe-se que não fica em casa e que continua a dar aulas numa escola privada não muito distante dali.

Os pais, muito naturalmente acabam por se fartar e dirigem-se ao director de turma. Primeiro um, um tanto a medo. Depois outro, e depois outro, até que todos percebem que o problema é geral.
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O director de turma pode ou não fazer alguma coisa. Não tem grandes incentivos para se chatear com o "colega". O "colega" também não tem grandes incentivos para se preocupar. O salário está pago, o contrato é vitalício, os pais não pagam salários, limitam-se a pagar impostos. O poder real dos pais sobre a escola é poiuco mais que nulo. O poder real do director de turma sobre o "colega" é nulo. É possível que o director de turma se chateie, é possível que fale com o "colega". Neste último caso, é possível o colega se sensibilize, mas é provável que tudo continue na mesma.

Próximo passo, no caso em que tudo continua na mesma: envolver a direcção da escola. A direcção da escola não tem nenhum poder sobre o professor. Essa será a primeira coisa que o director da escola explicará aos pais. Para além disso, a direcção da escola não terá grande interesse em se chatear com os seus eleitores. Algumas direcções até poderão levar o seu papel a sério. Mas outras não. Umas ganham o mesmo que as outras. Mesmo que o "colega" seja chamado ao directivo, o directiivo pouco poder tem sobre os professores que dirige. Não lhes paga salários, não os pode despedir, não os avalia. Tudo poderá continuar na mesma ou não.

O mais provável é que continue tudo na mesma. É possível que muitos pais desistam nesta fase. É possível que alguns alunos entretanto já tenham passado para escolas privadas. Mas se alguns pais forem suficientemente persistentes, o próximo passo é uma queixa formal à Direcção Regional de Educação. Alguns pais poderão estar hesitantes, afinal o professor será quem vai avaliar o respectivo filho no fim do ano (o tal problema da confusão entre ensino e avaliação). Outros poderão achar que não vale a pena tanta trabalheira. Por esta altura já devemos estar próximos do fim do ano. O professor faltou o ano todo, insultou os alunos o ano todo.

Poderá ser feita uma queixa à direcção regional, ou não. Se for, pode ser que avance rapidamente. Ou pode ser que fique na gaveta. Por vezes fica na gaveta. Surgem supeitas de compadrio na direcção regional. Correm boatos de que o professor tem lá bons contactos. É feita uma queixa para Lisboa. Em Lisboa podem dar atenção ao caso ou não. Em Lisboa eles têm muitos casos para tratar. Estão a apenas 3 níveis do topo da pirâmide. É muito trabalho e muita responsabilidade. Pode acontecer que o caso mereça atenção. Lisboa pede explicações à direcção regional. A direcção regional acaba por dizer que o processo está em andamento o que significa que só agora é que se lembraram dele. Lembro que os directores regionais são funcionários públicos com emprego vitalício garantido. O seu salário está garantido, façam bem ou façam mal.

O ano está quase a acabar. Os pais conseguem impedir que aquele professor volte a dar aulas aos seus filhos nos anos seguintes. Garantem também aulas de compensação para o próximo ano. Para o ano o professor faltosos dará aulas a outros alunos e incomodará outros pais. O processo começará de novo. O conselho directivo não tem poderes para recusar um horário àquele professor. Existe nas escolas portuguesas o direito ao horário. Aliás, os professores têm em muitas escolas o direito a escolher o horário por ordem de graduação. Este conselho directivo está de certa forma a violar os direitos habitualmente reconhecidos aos professores nas escolas.