17.2.05

Desemprego, demagogia e aproveitamento político (III)

Como era inevitável, "frei" Louçã veio dramatizar os últimos números do desemprego considerando-os sub-avaliados visto que, segundo ele, existe muito desemprego encapotado e envergonhado e que não entrará nas estatísticas do subsídio de desemprego.

Eu acho que "frei" Louçã tem razão, não tanto pelos inactivos envergonhados que, estou certo, irão porfiar até finalmente arranjarem trabalho, mas sobretudo pelos desavergonhados, aqueles que não entram nas estatísticas do desemprego, mas integram outra que estará em crescendo, a dos beneficiários do chamado Rendimento Social de Inserção (RSI), a actual designação do antigo Rendimento Mínimo, outra relevante causa de desemprego e que o João se esqueceu aqui de mencionar.

Devo dizer que detesto o actual nome daquele subsídio e considero que Paulo Pedroso, o "pai" do dito, baptizou-o de forma bem mais feliz do que Bagão Félix. Em bom rigor, a designação mais adequada seria Rendimento Social de Exclusão, de tal forma os seus beneficiários são marginalizados pela própria comunidade em que vivem, adivinhando esta em muitos deles mais oportunismo que carências, pelo conhecimento que têm (e todos nós temos) de múltiplos casos de abandonos de empregos para se habilitarem ao RSI. A existência deste tem potenciado uma indolência crescente no País e um curioso indicador que pode comprovar esta asserção é a evolução dos últimos anos do desemprego, que cresce em simultâneo com a absorção pelo mercado de trabalho de milhares de imigrantes.

A lógica do RSI insere-se na bandeira socialista e da esquerda em geral de distribuição do rendimento, a qual constitui uma enorme falácia. Isto porque existe o entendimento comum que a distribuição é posterior à produção, quando elas na realidade se processam em simultâneo. Quer isto dizer que os rendimentos gerados num processo produtivo já foram distribuídos ao longo deste ou seja, quando um produto ou serviço é disponibilizado no mercado, o valor acrescentado por si gerado, constituído por salários, rendas, juros e lucros, já foi apropriado pelos seus diferentes destinatários. Isto significa que qualquer política governamental destinada a alterar a distribuição do rendimento, tem um impacto imediato e garantido sobre o volume de produção e raramente (nunca?) se alcança o objectivo pretendido de uma "ideal" nova estrutura de distribuição. Se o governo pretende aumentar o peso dos rendimentos do trabalho e decreta aumentos salariais claramente acima do preço de equilíbrio para a oferta de emprego ou um salário mínimo demasiado elevado, as empresas tenderão a mecanizar processos ou a deslocar a produção para outros países com oferta abundante de mão-de-obra. Alternativamente, o governo poderá decidir aumentar a taxa de IRC, o que terá como efeito imediato a diminuição dos lucros, mas também a queda do investimento e a deslocalização para países com regime fiscal mais favorável. Em qualquer dos casos, o resultado final seria um aumento do desemprego e a completa frustração do nobre objectivo de aumentar os rendimentos do trabalho.

A implementação de um rendimento mínimo com o objectivo de atenuar a desigualdade e a exclusão, tem como efeito prático o aumento desta pela criação de incentivos a não trabalhar. Todo o ser humano actua intuitivamente de forma racional, o que o faz em toda a sua actividade confrontar custos com benefícios. Ora, em muitos casos, o decréscimo do rendimento dado pela diferença entre o antigo salário e o RSI, compensa os custos de ter de ir trabalhar: a deslocação, o tempo gasto nesta, a chatice de aturar o chefe e, se necessário desempatar, a inevitável opção pelo "lazer" em detrimento do "fazer". No limite, haverá milhares de pessoas a optarem por receber o RSI, despedindo-se para esse efeito dos respectivos empregos. A consequência a prazo disto é a criação de uma classe crescente a viver dos subsídios e do trabalho alheio que, por esse simples facto, será crescentemente marginalizada pela restante comunidade, tributada de forma cada vez mais pesada para sustentar a ociosidade daqueles. A ociosidade de muitos significa a persistência de recursos não utilizados e, por conseguinte, quebra na criação de riqueza e fatias cada vez mais exíguas para distribuir de um bolo que vai definhando. No final do processo, haverá porventura mais igualdade, mas ter-se-á eternizado a pobreza.