12.8.06

Controlo total dos fogos nascentes e outras utopias

Escreve o Paulo Gorjão sobre António Costa e os fogos florestais:

Sejamos claros: António Costa tem parcialmente razão quando salienta a incúria das populações. Dito isto, só agora é que a descobriu? Na altura em que andou a salientar a nova estratégia de combate aos fogos nascentes nunca lhe ouvimos uma palavra de alerta nesse sentido.
A verdade é muito simples. A estratégia de combate aos fogos que foi delineada -- que dava primazia aos fogos nascentes e que apontava para tempos de reacção na ordem dos 15 minutos -- fracassou. Ponto.


António Costa limita-se a seguir a estratégia que os portugueses esperam dele. Não passa pela cabeça do eleitor médio que os incêndios não sejam todos para apagar e que essa não seja uma responsabilidade do governo. Não passa pela cabeça do eleitor médio que possam existir outros responsáveis pelos que fogos que não o governo, que possam existir outras soluções que não as que passem pelo estado/bombeiro.
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A estratégia da primazia aos fogos nascentes só pode fracassar porque exige que o estado disponha de meios permanentes ajustados às piores condições climatéricas possíveis e à máxima quantidade de biomassa imaginável. A estratégia exige ainda que para cada terrono florestal os bombeiros tenham uma eficácia de 100% durante anos seguidos. Exige também que o estado substitua progressivamente as responsabilidades dos proprietários cada vez mais desinteressados por causa de uma das consequências previsíveis do combate aos fogos: a queda permamente do preço da madeira.

Para levar uma dada plantação até estar pronta para a colheita da madeira, os bombeiros teriam que ser bem sucedidos não só este ano, mas também os próximos 10, 20 ou até 30. Imagine-se 20 anos de sucessos permanentes sem uma única falha com a biomassa no terreno a aumentar continuamente e com episódios climatéricos extremos pelo meio. É impossível. Seriam necessários níveis de excelência e recursos materiais e humanos que não existem em mais nenhum sector da sociedade portuguesa.

Note-se que um dispositivo que fosse bem sucedido durante 3 anos seria um sucesso político para o ministro Costa. A avaliação dos ministros nesta matéria como noutras é feita com base em critérios de curto prazo. Só que um dispositivo de combate aos fogos que funcione bem durante 3 anos e depois colapse é um fracasso. Mesmo um dispositivo que funcione bem durante 10 anos e depois colapse é um fracasso. Segue-se que nenhuma política florestal pode sequer ser avaliada ao fim de 3 ou 10 anos. Mas o que é engraçado é que em Portugal se avaliam as políticas de combate aos fogos ao fim de 3 meses.

Mais uma vez, não passa pela cabeça do eleitor médio, ou mesmo do comentador médio, que a dinâmica dos fogos florestais tem escalas de tempos muito superiores à de uma legislatura. E como não lhes passa pela cabeça, exigirão sempre ao governo as medidas erradas. E os governos farão tudo para tomar as medidas erradas.