14.4.06

Um elogio às faltas

As faltas dos deputados não são um problema assim tão grave. Até parece que estamos perante uma grande perda. Tendo em conta a contribução da maior parte deles para a qualidade da legislação produzida, não sei se as faltas dos deputados não devam ser consideradas bastante positivas para o país. Para além disso, estas faltas resolvem dois problemas à Assembleia da República. Em primeiro lugar, já não é necessário reduzir o número de deputados pois só metade é que exerce efectivamente as suas funções. E em segundo lugar, o problema da incompatibilidade entre a função de legislador e a função de advogado fica automaticamente resolvido já que os senhores deputados que são advogados nem sequer chegam a exercer a função de legislador.
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Deve no entanto dizer-se que o sistema de faltas e os ralhetes de sua Excelência o Presidente da República não contribuem em nada para dignificar a função de deputado. Espera-se que um deputado seja um individuo autónomo com capacidade para distinguir as votações verdadeiramente importantes daquelas que não interessam a ninguém. Faltar a uma votação devia ser um acto político tão natural quanto o de estar presente. Pudessem os senhores deputados faltar livremente às votações sem ter que se justificar e o país seria poupado a dezenas e dezenas de leis inúteis.


Aliás, com tanta legislação em vigor, muita dela considerada a mais avançada do mundo, nem sequer se justifica que o Parlamento esteja aberto o ano inteiro. Dez ou vinte dias por ano seriam suficientes para aprovar a legislação realmente necessária. No resto do tempo o Parlamento poderia estar fechado que ninguém sentiria a sua falta.

De qualquer das formas, os deputados nem sequer têm autonomia para tomar as suas próprias decisões. Estão lá para fazer quórum, e só se nota a sua falta nos raros casos em que não há quórum porque eles não se coordenam e resolvem faltar todos ao mesmo tempo.