10.7.06

A IDEIA DE PEDRO ARROJA E OS CHAVÕES DO COSTUME (1)


Alguém, durante a discussão provocada pela interessantíssima ideia de Pedro Arroja, avançou com um tradicional argumento ingénuo-socialista:
«Gostava de perguntar a todos os comentadores se têm problemas que as suas contas sejam vistas pelo fisco? Não? Eu também não!
QUEM NÃO DEVE NÃO TEME, e passe o exagero da questão, o Estado, que deveríamos ser todos nós, tem de ter armas para combater a 'banditagem', muitos dos quais, são quase nossos vizinhos
»
Em primeiro lugar, o Estado não «somos todos nós». O alicerce prioritário da Liberdade reside na separação higiénica entre Estado e Sociedade, entre poderes públicos e os povos que lhes estão submetidos. A confusão subjacente a esse chavão é perigosa, colectivista e permissiva, amontoa conceitos e realidades distintas e liberta os poderes públicos para exercerem comportamentos desrazoáveis e crescentemente abusivos - já que, afinal, "somos" todos o mesmo e o resultado das acções públicas irá inexoravelmente favorecer-nos a "todos" por igual. Não é assim. ### O Estado, a sua máquina administrativa, os detentores do poder político, possuem fins próprios, gerados na circularidade das suas organizações, fins esses que são totalmente distintos dos interesses das pessoas e amiúde com eles conflituam. Não há um só exemplo de uma ditadura contemporânea (um só!) que não tenha decorrido desta ideia de que os objectivos do Estado e os interesses das pessoas são uma e a mesma coisa. Que é como quem diz, «o Estado somos todos nós»...

Em segundo lugar, quanto ao maiúsculo «QUEM NÃO DEVE NÃO TEME», essa premissa é um absurdo. Do tipo de muitos outros que serviram de pretexto para que o Estado incrementasse os seus poderes e oprimisse as pessoas em muitos lugares e tempos variados.
Não é o facto de alguém não ter cometido qualquer ilícito que deve justificar o exagero de permitir ao Estado a fiscalização de todos os pormenores da sua vida privada - incluindo a vida bancária. Por mim, temo os poderes desmesurados do Estado ainda que não esteja envolvido nalguma actividade ilegal. Sempre que o Estado tem amplificados os seus poderes de interferência na vida das pessoas, estas devem temer e muito. Comprova-nos cabalmente a história do Estado moderno que, vezes demais, esse aumento de poderes não é aplicado no fim declarado mas sim em objectivos relacionados com a manutenção dos poderes e privilégios públicos.
O fim do sigilo bancário não se destina a combater nenhum dos males que os "servidores da causa pública" tanto apregoam - resume-se a uma velhíssima questão de poder. Poder do Estado (e dos seus actuais protagonistas) sobre as pessoas.
Também não tenho nada de ilegal ou de errado dentro do meu frigorífico - no entanto, sentir-me-ia ofendido e quase violentado caso fosse permitido aos esbirros do Estado fiscalizar o seu conteúdo...