13.5.05

Sobre o insucesso escolar

O nosso leitor JBM, volta a escrever-nos com a sua habitual truculência, insurgindo-se contra as "preocupações" de alguns altos responsáveis com o insucesso no ensino universitário. Um tema que JBM conhece como poucos:



A PROPÓSITO DAS AFIRMAÇÕES DE 3 ALTOS RESPONSÁVEIS DESTE PAÍS


1. O PR mostra-se preocupado com a elevada percentagem de estudantes que não conseguem concluir os seus cursos superiores. Pergunta porquê. Insinua que a culpa é dos professores e responsáveis das universidades públicas. Pensou, meditou, e aí está a solução: avaliação externa das universidades por estrangeiros.
O PR sabe bem o porquê das muitas reprovações. O PR sabe bem que os alunos entram nas universidades com médias de 3 ou 4 valores nas disciplinas específicas de cada curso, como acontece nos de engenharia e ciências.
O PR sabe que, mesmo indo avante (tenho dúvidas) a anunciada medida do governo de que só entrarão num dado curso universitário os alunos do secundário com média igual ou superior, nas provas específicas, de 9,5 valores, o problema não deixa, por esse facto, de existir:

  • Porque os pontos das provas específicas continuam a ser elaborados por professores do secundário, não se sabendo como são escolhidos. Os professores das universidades não são para isso ouvidos nem achados!
  • Porque na média geral de entrada nas universidades o peso das provas específicas é pequeno.
  • "Last but not the least", porque a tal grande parte dos estudantes (?) que não concluem os seus cursos, não estuda desde o início do ano escolar. Não tem hábitos de trabalho nem de raciocínio. Faz "directas" nas vésperas de cada exame para depois despejar nas folhas de prova o que decorou na noite anterior. Além disso, procura "passar" ou com fraude (passa, por telemóvel ou outro meio, para um colega dos últimos anos no exterior da sala de exame, o texto da prova e vai depois à casa de banho buscar o ponto resolvido!) ou então, usando a força que hoje os estudantes têm sobre os reitores e outros responsáveis universitários, exigem exames e mais exames em cada disciplina: duas chamadas em Junho, duas em Julho e mais 1 ou 2 em Setembro ou Outubro, esperando que "água mole em pedra dura tanto bata até que fure".

O PR sabe tudo isto e muito mais. Então porque insinua que os culpados são os responsáveis das universidades? Sem dúvida que alguns professores também o são, mas não por exigirem demais, antes por não saberem ensinar e exigirem o que não dão, nem sabem dar. Melhor fora que o PR pressionasse a AR e o Governo, como é sua prerrogativa, no sentido de elaborarem legislação que:

  • Revogue as leis do PREC que atribuem aos estudantes o controlo do Senado, permitindo-lhes, com os seus votos mais o de um qualquer funcionário, eleger o reitor, ainda que contra os votos de todos os docentes. Semelhante aberração, só existe em Portugal.
  • Permitam a exclusão das universidades, nos 2 primeiros anos, dos alunos desprovidos de atributos (de trabalho e/ou de inteligência) para levarem a bom termo o curso em que se inscreveram, como sucede nas boas universidades europeias. Veja-se, a este título, o caso da holandesa Delft, onde 50% dos alunos que entram nos cursos de engenharia são excluídos nos dois primeiros anos, facto aceite com toda a naturalidade e que jamais constitui motivo de parangonas na comunicação social e de alarmismos sobre insucessos ou abandonos escolares, responsabilidade dos docentes e outras alarvidades do género. Os alunos excluídos têm vários caminhos a seguir: ou vão para os politécnicos (fachhochshules) ou para escolas profissionais de nível médio, devidamente apetrechadas para ministrarem cursos que exigem mais habilidade manual e menos inteligência.
  • Permitam a fixação de precedências (pré-requisitos) para inscrição em disciplinas sequenciais de um dado curso, como existem há várias dezenas de anos em instituições mundialmente reconhecidas como é o caso do MIT. Ah, mas se assim fosse haveria mais ?insucesso escolar? e os tais ?estudantes?(?), os sindicatos, etc., ainda fariam mais arruaças do que actualmente.

O PR conhece muito bem tudo isto. Mas falou. Interrogou. Mostrou-se preocupado. O que pretende afinal o PR? Que os docentes das universidades deixem "passar" os alunos sem saberem? Quer que os cursos superiores em Portugal sejam como a maior parte deles no Brasil, cursos PPP - Pagou Propinas Passou?! Que diz o PR da miséria em que já estão as "licenciaturas" em Portugal quando uma professora (?) "licenciada" em Física vem à televisão e não consegue dizer o que é um ângulo recto, como todos os portugueses viram há poucos dias?


2. O Presidente da CNAVES limitou-se a dizer que as universidades e os cursos já são avaliados por "comissões independentes" integrando inclusivamente elementos estrangeiros, mas que os responsáveis das universidades (públicas?) não implementam as recomendações dessas mesmas comissões. E reclama legislação que obrigue as universidades (públicas?) a implementar tais recomendações.

Porém, o Presidente da CNAVES está consciente de tudo o que acima escrevi, porque é público. Também sabe que a grande maioria de tais recomendações não pode ser implementada pelas razões que abaixo transcrevo, com conhecimento de causa. Além disso, essas recomendações não teriam qualquer efeito na taxa de reprovações porque, em geral, elas não se referem aos males acima apontados. Versam apenas sobre aspectos de planos de estudo, de condições de trabalho em salas de aula, laboratórios e bibliotecas, etc. Praticamente nunca se referem ao grau de exigência exigível no Ensino Universitário e que pode ser aferido pela leitura dos enunciados dos exames aos quais os alunos são submetidos.

Já participei numa dessa comissões constituída por 4 professores das principais universidades portuguesas e 2 estrangeiros e constatei o seguinte: cada professor defendia, como o melhor, o modelo da "sua" universidade (ou curso) e propunha a sua aplicação na universidade (ou curso) em julgamento. Resultado: obteve-se no relatório final (de compromisso) um conjunto de recomendações heterogéneas a implementar pela universidade em causa. Em geral, as universidades visadas não puderam implementar a maior parte do recomendado, não só por razões económicas, mas, sobretudo, porque as recomendações eram baseadas num figurino completamente alheio ao da universidade visada, não tendo em conta, por exemplo, a interacção das áreas de ciências e de engenharia num dado curso de engenharia. Nenhuma das recomendações foi no sentido de "sanear" os males fundamentais do funcionamento das universidades públicas portuguesas, embora esses aspectos tivessem sido bastante discutidos. Era preciso não melindrar nenhum órgão superior!...


3. O Presidente do CRUP também não respondeu ao PR. Limitou-se a reafirmar que as universidades já são avaliadas, mas que não é possível implementar as recomendações feitas pelas comissões avaliadoras. Ele sabe bem porquê, mas não o disse, certamente para não melindrar...

O Presidente do CRUP conhece bem as mazelas acima indicadas. Sabe que as universidades não podem escolher (nem querem!) os alunos que nelas entram. Ele sabe que os colégios privados do secundário dão notas elevadas aos alunos para conseguirem introduzi-los de qualquer formas nas universidades. Ele até sabe que as universidades privadas dão notas elevadas nas suas licenciaturas para que os "seus" diplomados conquistem bolsas de doutoramento (e outras) para estudos no estrangeiro, ficando à frente dos licenciados pelas universidades públicas, o que leva, infelizmente, a que estas baixem o nível de exigência para poderem concorrer!...

Assim ficam todos contentes: os governos e as universidades públicas não vêem os estudantes fazer arruaça. Os sindicatos satisfazem os seus fins. As universidades privadas melhoram os seus "negócios"... Portanto, o "status quo" convém a muita gente. Só não convém ao futuro dos nossos netos.

JBM