8.5.05

A «RE-FUNDAÇÃO»



Ainda não venceu um mês sobre o Congresso do CDS que providenciou a sua substituição na liderança, e o Dr. Paulo Portas já «anda por aí», o que, na gíria actual, quer dizer que regressou à política activa.
Não era, aliás, outra a expectativa que o «maior amigo do CDS», como pitorescamente lhe chamou Luís Queiró, deixara a qualquer observador minimamente atento, no seu abandono das funções partidárias. Paulo Portas é, como bem notou Vasco Pulido Valente, a única personalidade que sobra à direita, se descontarmos o eterno Professor Cavaco, de malas aviadas para o Palácio de Belém e, na hora da despedida, ele não disse que deixaria a política, mas tão-só a presidência do CDS. Por outro lado, Portas é novo, podendo bem averbar algumas derrotas pessoais na sua folha de serviços. O que, de resto, esteve longe de suceder na noite eleitoral de 20 de Fevereiro, apesar dos seus imensos e incompreendidos esforços em demonstrar o contrário.
O que Portas teve como comprovado nessa noite foi a impossibilidade do CDS conseguir aproximar-se eleitoralmente o PSD, de modo a guindar o partido a uma posição que, a prazo, permitisse substituir-se àquele outro nas preferências do eleitorado de direita. Portas quer ser primeiro-ministro e, para isso, sabe que tem de unificar a direita. Seja qual for a forma de o fazer, no dia 20 de Fevereiro último, no mais baixo pico eleitoral de sempre do PSD, o CDS demonstrou que não serve para esse fim. Por isso, Portas teve de sair.
Volta agora com uma Fundação apoiada pela ala conservadora do Partido Republicano norte-americano, e com a intenção anunciada de nela federar «liberais e conservadores». Note-se, de imediato, a seguinte curiosidade: Portas, ultimamente muito avesso ao liberalismo, refere como primeira prioridade atrair liberais para o seu projecto político dos próximos quatro anos. Porquê?
Pela simples razão que o regresso ao poder da direita só poderá ser feito sob a apresentação de um programa e de um projecto claros para Portugal. De ideias que sejam novas, entusiasmem o eleitorado e mobilizem os portugueses. De propostas governativas que marquem uma clara diferença em relação ao que o PS costuma fazer. Ou seja, de uma identidade própria e nova para a direita, como outrora sucedeu com Sá Carneiro e com cavaco Silva.
O que faltou, aliás, nos dois governos da coligação, que se limitaram a gerir o Orçamento de Estado herdado dos governos socialistas, sem acrescentarem um módico de uma ideia original para Portugal. Os sacrifícios impostos ao país foram-no para quê? Que reformas promoveu o governo? Que objectivos eleitorais cumpriu? Quantas empresas públicas extinguiu? Quantos «boys» poupou ao erário público? Em suma, o que diferenciou o governo da coligação de direita do que costuma fazer o PS quando governa Portugal? Essa foi a pergunta que os portugueses fizeram aos partidos da direita que, diga-se, não lhes souberam dar resposta. Os resultados deste autismo político ficaram bem à vista nos resultados eleitorais.
Por isso, Portas sabe que em vez de preparar o futuro numa lógica elementar de aritmética político-partidária entre o CDS e o PSD, ficando quatro anos na oposição à espera do desgaste governativo do PS e que o poder regresse pendularmente à direita, é necessário que a direita, desta vez, se prepare para governar e o faça em torno de uma ideia unificadora e legitimadora, e de objectivos nacionais que os portugueses pressintam como seus. Através da anunciada Fundação, Portas poderá criar um quadro de fundo ideológico e programático que junte a direita em torno de um objectivo nacional.
Ora, não tendo a democracia-cristã nada a dizer a ninguém e ignorando-se o que possa ser a social-democracia e o que a distingue do que defende o PS, o liberalismo pode efectivamente propor uma nova relação entre a sociedade portuguesa e o Estado, e contribuir para dar resposta àquele que é o nosso principal problema político: como viver e progredir com este Estado, ou seja, mutatis mutandis como mudar o Estado de maneira a que ele nos deixe progredir e viver.
De todo o modo, sejam quais forem as reais intenções do Dr. Portas e as que vierem a presidir à sua novel Fundação luso-americana, desengane-se quem julgar que ele se prepara para ser o novo Dr. Rui Machete da direita nacional.